Quero falar de uma Maria
Ausente, escondida
feito coruja nos campos
rasga mortalhas das noites
distante do mundo
sem saber ler nem escrever seu nome
Em sua infância tão pobre
um amiguinho invisível ensinou-a a inventar brinquedos
amarelos, verdes, azuis...
Eram brinquedos tão lindos!
Ninguém, senão Maria, tinha aquele privilégio
de brincar com o menino Jesus
Mas um dia Ele partiu...
deixando-a envergonhada de ter crescido assim
com uma sina obstinada, tatuada, corpo e alma
para levar a mensagem ao povo de Juazeiro
Teve chagas pelo corpo
teve a bocas alagada do sangue da hóstia consagrada
O sangue corria dos lábios, pela língua e pelas mãos
pelos paninhos brancos que o padre limpava o chão
Maria de Araújo!
Quem te fez assim tão forte
Sozinha na noite escura da cidadezinha pobre
desalentada, desacreditada pela Santa Inquisição?
Ah, essa Maria de tantas dores...
Insubmissa às leis humanas
deu comunhão a dois padres da primeira comissão
Insultada, perseguida pela Igreja arrogante
que não acreditava que Deus amava aquela mulher
pobre, negra e analfabeta.
O bispo não concebia que o divino condenava
a tripla discriminação
e escolheu a beata, chamada Maria de Araújo
pra transmitir ao seu povo sua mensagem de amor
como escolhera outrora
os tão pobres pescadores
homens analfabetos que se tornaram apóstolos
da fé que Jesus pregou
A beata do milagre afrontou a arrogância
da segunda comissão
E quando foi inquirida e lhe dada a hóstia na boca
falou com toda ousadia:
“Jesus Cristo tá dizendo, que a hóstia não sangrou
pois os padres da comissão não estão em estado de graça
pra me dar a comunhão”
Por isso foi torturada,
Presa na sozinha cela da Casa de Caridade
Ao voltar pra sua terra
Morreu triste e esquecida
Sem véu, sem nome, sem lar
Padre Cícero ordenou dar-lhe enterro merecido
Mas mesmo depois de enterrada
ainda foi injustiçada
Teve o túmulo violado
como quem nunca nasceu
Mas um dia Juazeiro vai lembrá-la com amor
e dar-lhe a paz merecida
sabendo que Jesus Cristo
amou aquela mulher ousada e destemida
Que assim seja!
Nilze Costa e Silva
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O amor de todo mundo Para mudar o mundo.... (Ítalo Rovere) Abraços Poéticos